terça-feira, 28 de março de 2017

E A SAÚDE EM SERGIPE?



E a Saúde em Sergipe? (28/03/2017)

Completa-se dois meses que a Saúde está sob nova direção. O Secretário Zé Almeida pôs abaixo a herança encontrada e prometeu mudanças. Contudo, não deixa claro quais seriam as mudanças. O Ministério Público Federal, em documento publicado em 20/03/2017 foi objetivo no diagnóstico: “os trabalhos técnicos realizados nos últimos cinco anos tem tornado visível, há muito tempo, a atual incapacidade do Gestor Estadual de Saúde em prestar, de modo adequado e com o emprego correto dos recursos públicos, as ações e serviços de saúde que lhe competem no âmbito do Sistema Único de Saúde – SUS, neste Estado da Federação. “

O MPF acredita que essa incapacidade de gestão está diretamente relacionada ao modelo utilizado neste Estado da Federação, o qual optou  pela transferência de suas responsabilidades constitucionais à Fundação Hospitalar de Saúde – FHS, gerando total descontrole sobre a adequada, efetiva e eficiente aplicação dos recursos públicos destinados a ações e serviços de saúde em Sergipe, e que a Secretaria de Estado da Saúde (SES) não vem exercendo nenhuma fiscalização. No mesmo documento, o MPF aponta 43 irregularidades no uso dos recursos públicos por parte da Fundação Hospitalar.

O Ministério Público aponta problemas reais, cuja a solução é necessária, mas não suficiente para tirar a Saúde do buraco. A política adotada com a chamada “reforma sanitária de Sergipe” é que seguiu caminhos inviáveis. Destinar todos os recursos para atenção hospitalar é um erro grosseiro, quando a epidemiologia aponta para o predomínio do envelhecimento e das doenças crônicas. O Estado de Sergipe não destina um centavo para ações preventivas, nem para a rede básica, PSF, educação em saúde, vigilâncias, etc. etc. Um gestora do HUSE fala muito na imprensa que o problema está nos municípios, creio que por desinformação.
Para afirmar o que disse acima, fui ao Portal de Transparência (http://www.transparenciasergipe.se.gov.br/TRS/Despesas/Orgaos.xhtml) para conhecer as despesas realizadas pelo Estado e lançadas até esse momento. A Secretaria da Saúde já gastou esse ano 94, 6 milhões de reais, dos quais 80, 5 milhões foi transferência para as Fundações (Hospitalar – 72,8 milhões; Parreiras Horta – 3,3 milhões; e Saúde – 2,9 milhões), a secretaria ainda repassou para hospitais de caridade quase um milhão. Não identifiquei nenhuma transferência para os municípios fortalecerem a rede de atenção básica. Prioridade zero. Não precisa muito sabedoria para entender porque os hospitais estão lotados.
Um olhar paralelo me chamou a atenção, além de se gastar mal, com prioridades invertidas, gestão precária, falta de planejamento, excesso de comissionados (segundo Almeida), desvios (segundo MPF); se gasta pouco com o SUS, sem viabilidade de aumento. Me espantou observar que o Estado gastou esse ano com o IPES Saúde, para atender servidores públicos e dependentes, 37,8 milhões; mais de um terço do que a Secretária de Saúde dispõe para atender a toda população de Sergipe, e muitas vezes dos estados vizinhos.

Sei que para Zé Almeida cumprir o que vem prometendo não será fácil, mas ele precisa começar. Por enquanto é só briga e discurso. Ingenuamente acredito que se ele procurasse envolver a sociedade, convocando a 7ª Conferência Estadual de Saúde, sem manipulação, livre e soberana, para definição de uma nova política de saúde, seria o caminho mais adequado. Contudo, reconheço que os tempos são rombudos, de eliminação de direitos, desmonte do estado de bem estar social, tempos de crise da democracia e de escuridão. Só tenho uma certeza, o Secretário Zé Almeida precisa apontar o que vai fazer e começar.   

quarta-feira, 22 de março de 2017

Quando e quem realizou a primeira operação cesariana em Sergipe?


Quando e quem realizou o primeiro parto cirúrgico em Sergipe?
A poucos dias publiquei a desventura de Dona Capitolina Alves de Melo, segunda esposa do Governador Guilherme de Souza Campos, que morreu de parto dentro do Palácio, em 13/12/1907; por não existir em Sergipe nenhum médico que soubesse fazer um parto cirúrgico, conhecido como cesariana.
Fiquei curioso: a partir de quando e quem realizou o primeiro parto cesariano em Sergipe? Lendo um discurso de Augusto Leite (foto) por ocasião do 30º aniversário do Hospital de Cirurgia, publicado no Boletim do Centro de Estudos, Vol. 4, Nº 5, de setembro/outubro de 1956, encontrei a resposta para a minha dúvida. Diz Augusto Leite: “Inaugurada a Maternidade Francino Melo (setembro de 1930 - a primeira de Sergipe), abria-a imediatamente a todos os parteiros da cidade. O primeiro parto normal foi feito por Otaviano Melo, o segundo por Ávila Nabuco, o terceiro, por Carlos Menezes, o quarto por João Firpo. Defendia desta arte, um pensamento, uma atitude, um programa de trabalho, nesta Casa.”
Continua Augusto Leite: “Não me incluí, nesta lista. Não era, aliás, um neófito na arte. Havia feito curso especial na Maternidade Baudelocque, em Paris, e já contava, no meio aracajuano, muito parto, em gente do nosso escol. Desse passado, está entre nós, nesse momento, a recordar-me alegrias que não se apagam, a senhorita Helena Santos. Veio ao mundo, pelas minhas mãos, precisamente há 26 anos. Ela documenta a primeira operação cesariana feita em Sergipe. “
Desfeito o mistério, a primeira cesariana em Sergipe foi realizada pelo Dr. Augusto Leite, em 1930, na maternidade Francino Melo. A medicina chegou tarde a Sergipe. 

segunda-feira, 20 de março de 2017

A LITERATURA DE RANULPHO PRATA


Ranulpho Hora Prata – o fundador da radiologia em Sergipe.
Nasceu em 04 de maio de 1896, em Lagarto/SE, filho de Felisberto da Rocha Prata e Ana de Vaaconcelos Hora. Inicia os estudos em Estância, depois transferiu-se para Salvador onde concluiu o Ginásio. Ingressou na Faculdade de Medicina da Bahia, estudando até o quarto ano, quando se transfere para Rio de Janeiro, concluindo o curso em 30 de dezembro de 1919, defendendo a tese “Do Riso”.. Em seguida transferiu-se para Mirassol, SP, onde se casou com Dona Maria da Glória Prata. Em 1925 retorna a Sergipe, a convite de Augusto Leite, para organizar o serviço de radiologia do Hospital de Cirurgia. Em 1927 foi para Santos, ocupar a vaga de radiologista na Santa Casa de Misericórdia. Pai do Dr. Paulo Prata (filho único) e avô de Henrique Prata, do conceituado Hospital de Câncer de Barretos, SP. Faleceu em São Paulo, tuberculose, em 24 de dezembro de 1942, aos 47 anos, internado no Hospital Santa Cruz.
Ranulpho Prata é Patrono da cadeira sete da Academia Sergipana de Letras e da cadeira vinte e tres da Academia Santista de Letras. Aprovado para a cátedra de literatura do colégio Pedro II, em Aracaju, cargo que não assumiu. Escreveu o tropeiro, conto, 1916; O Triunfo, romance, 1918; Do Riso, tese de medicina, 1921; Dentro da Vida, novela, 1922; a Longa Estrada, contos, 1925; o Lírio na Torrente, romance, 1926; Lampião, documentário – 1934; Navios iluminados, romance, 1937. Vários manuscritos ficaram inéditos, inclusive um romance Uma Luz na Montanha.
Qual o lugar de Ranulpho Prata na literatura brasileira? O crítico Geraldo Azevedo (1955), citado por Paulo de Carvalho Neto,  faz a seguinte análise: “Não será inverdade afirmar que Ranulpho Prata é um dos grandes injustiçados da literatura nacional. Nossa crítica, tão pródiga em dispensar elogios, ainda não se deteve para estudar a obra, não muito vasta, do escritor sergipano. Compreende-se até certo ponto essa ausência: é que Ranulpho Prata, de temperamento arredio, lutando sempre contra a pertinácia da doença (a tuberculose não tinha cura), vivendo exclusivamente para o trabalho e a família, não teve tempo de brilhar nas reuniões pseudos literárias, em que o cabotinismo, a auto incensação, a bajulação sem termo nem medida tomam a maioria das horas daqueles que procuram a glória sem querer participar das renúncias que a arte exige dos seus seguidores. Felizmente, o tempo não conserva ídolos de barro. E os que viveram uma vida literária sem literatura acabarão por ceder o lugar que injustamente ocupavam aos homens de têmpera e valor. Um dia, quando se fizer uma revisão honesta da história de nossas letras, Ranulpho Prata de certo aparecerá com o esplendor de sua grandeza humana. A obra que construiu cheia de brasilidade e calor, de ternura e emoção emergirá do esquecimento atual para o deslumbramento das gerações futuras. Nesse dia, a crítica literária nacional, terá apagado da história de nossas letras mais uma injustiça. “
Paulo de Carvalho Neto nos conta uma passagem deliciosa da amizade Lima Barreto com Ranulpho Prata: “Lima Barreto elogiou o livrinho – conta Ranulpho Prata a Silveira Peixoto, em 1940 -, e foi visitar-me no Hospital do Exército, onde eu era interno. A visita desse mulato genial deu-me grande alegria. Sentados num dos bancos do imenso parque do hospital, o Lima, meio tocado, como sempre, mas perfeitamente lúcido, claro, brilhante mesmo, queria saber com segurança se a Angelina do romance era realmente bonita como eu a pintara. Todos os ficcionistas, dizia-me com ironia, tem a mania de fazer belas raparigas das cidades pequenas. Nos lugares por onde eu andara não vira nenhuma... Eram todas feias, grosseiras, desalinhadas... E eu garanti que a minha Angelina era, positivamente, encantadora, capaz de virar cabeças sólidas de gente das grandes cidades. “

Uma literatura social influenciada por Jackson de Figueiredo, de quem era grande amigo. Uma poesia em defesa dos oprimidos de inspiração cristã, é essa a sua obra. Mais recentemente Ranulpho Prata começou a ser descoberto pelos estudiosos da literatura, a sua obra foi tema para tese de mestrado “História e Literatura no Porto de Santos – o romance de identidade portuária, Navios Iluminados, defendida por Alessandre Alberto Atanes Perreira, na Universidade de São Paulo; bem como teve o citado livro republicado pela editora da USP. 

domingo, 5 de março de 2017

A LOUCURA EM SERGIPE



A Loucura em Sergipe.

O Jornal Correio de Aracaju, edição de 23 de fevereiro de 1943, divulgou com grande ênfase uma carta do Dr. Garcia Moreno (FOTO), Diretor da Colônia de Psicopatas, anunciando importantes incorporações tecnológicas da psiquiatria sergipana. Observem os termos mais esclarecedores da missiva:

“Comunico que desde outubro de 1942 o nosso Hospital Colônia de Psicopatas inclui em seus trabalhos rotineiro, ao lado da aplicação mais antiga dos métodos de Sakel e Meduna (insulina e cardiazol), a convulsoterapia de Cerletti e Bini”.

“Possuímos um aparelho de eletrochoque terapia fabricado pela Offener Electronies, dos Estados Unidos, do tipo mais moderno e portador das mais recentes inovações técnicas, de notáveis vantagens práticas (máquina de curar louco). Custou ao Governo Estado perto de treze mil cruzeiros e chegou a Aracaju por via aérea, o aparelho pesa menos de oito quilos”.

“Quase quarenta pacientes já foram, entre nós, submetido ao método de Cerletti, num total de crises convulsivas que andam perto de novecentas”.
A convulsoterapia elétrica era apontada como um grande avanço para psiquiatria pelas seguintes vantagens: baixo custo; rapidez na aplicação; e substituir a convulsoterapia cardiozóliza, muito temida pelos pacientes devido à elevada freqüência de fratura de costelas.

Continua Dr. Garcia Moreno em sua carta:
“Aqui, como em outras partes, duas a três aplicações semanais de uma corrente elétrica de 450 miliampere, durante 0,2 segundos através do cérebro, tem em pouco mais de um mês reconduzido a vida psíquica normal homens e mulheres”.
“Como se vê, a psiquiatria não é mais uma especialidade médica de literatos e filósofos. Não na medicina moderna, afora a cirurgia, setor de maiores ousadias técnicas. Como se vê, o doente mental encontra hoje recursos terapêutico tão eficientes quanto os que beneficiam as demais especialidades médicas”.

Em 31 de dezembro de 1943, o Interventor Federal em Sergipe, Augusto Maynard, através do Decreto-Lei nº 364, criou o Manicômio Judiciário de Sergipe, que recebeu o nome de Lemos Brito. A nova instituição funcionava junto às dependências do Reformatório Penal.


Pelo Decreto, em seu artigo 2º, o Manicômio destinava-se ao internamento dos criminosos loucos e dos loucos criminosos já sentenciados; ao recolhimento dos isentos de responsabilidades, mas que por motivos de afetação mental, forem considerados perigosos para a ordem pública ou a segurança coletiva; à guarda dos condenados, que no curso da pena haja manifestado perturbação mental. Como se percebe, na década de 1940, os doentes mentais em Sergipe continuavam encarcerados na Cadeia Pública.

sábado, 4 de março de 2017

A CEGUEIRA EM SERGIPE


A cegueira em Sergipe.

O Dr. José Rodrigues Bastos Coelho, médico sergipano, organizador do nosso Departamento de Saúde Pública, no primeiro Governo de Augusto Maynard (1930 – 1935), nos informa em seu ensaio “Coisas e Vultos de Aracaju” que, de acordo com o censo de 1940, Sergipe possuía 1.347 cegos, numa população de 542.320 habitantes. Isso dava uma incidência de 248,4 cegos por cem mil habitantes, taxa das mais altas do Mundo.

A oftalmologia engatinhava em Sergipe. Mesmo sendo uma das primeiras especialidades da medicina, as cátedras de oftalmologia foram instaladas nas duas faculdades brasileiras desde 1883. Entretanto, na prática, o trabalho do “oculista”, foi um dos espaços mais desejado dos charlatões.
Entre as doenças oculares mais frequentes em Sergipe até a primeira metade do século XX, preponderavam o “terçol” (pequenos furúnculos nas pálpebras); “Sapiranga” ou “Sapigoga” (blefaroconjuntivite com perda das pestanas); as “Conjuntivites”; “Oftalmia Purulenta (Tracoma); “Névoas Brancas” (catarata); “Arcus Senilis” (endurecimento da córnea pelo excesso de claridade); “Cegueira Noturna” (hemeralopia, decorrente da avitaminose “A”); “Gota-Serena” (amaurose, perda da visão sem lesão aparente, tratada com a guabiraba). É importante distinguir a Gota-Serena da Gota-Coral (nome dado a epilepsia) e da gota (podogra – artrite gotosa, uma forma grave de reumatismo).

Entre as devoções populares uma das santas mais adoradas era Santa Luzia, a protetora das vistas. Era comum em Sergipe que no dia da Santa (13 de dezembro, mas se comemora todo o dia 13), aproveitadores andarem de porta em porta, com a imagem ou gravura da Santa na mão, pedindo esmola para a mesma. Pouca gente tinha coragem de negar essa tão pequena dádiva em troca de tão grande proteção.

Entre os tratamentos para doenças oculares encontramos “suco de cansanção”, “sumo de umbaúba”.


Pintura de Pieter Brueguel, o Velho (1525-1569).